Opinião

Direito ou Justiça?

15 abr 2021 12:05

Meu Caro Zé, Tenho, por vezes, brincado com os meus colegas da universidade, da área do Direito, dizendo-lhes que não vale a pena encherem os estudantes de teorias sobre Direito e, pelos vistos, muito menos sobre Justiça

Basta, brincava eu, dar-lhes umas noções fortes e cuidadas do “processo”, nas várias áreas específicas do Direito.

Assim, os estudantes ficam preparados para atuar, sem terem de ter problemas éticos, que não só resultariam das vivências das teorias, mas da consciência rapidamente adquirida na prática, de que, com preocupações éticas, provavelmente não ganham a vida.

O que se passou com a fase de instrução do “processo Marquês” e com a atuação (foi mesmo teatral e “one man show”) do juiz Ivo Rosa, afinal e infelizmente, que aquilo que eu considerava brincadeira é mesmo a sério.

Não estou, com isto, a defender que as regras formais e processuais não são necessárias até para defesa de todos, mas o conteúdo, ou seja, a realidade dos factos, é o principal e não pode ser obliterado por regras processuais que advogados bem pagos por quem o pode fazer sapientemente com processos dilatórios ou explorando potenciais “buracos” legais (e quem os cria?) que levam, no limite, até à prescrição dos putativos crimes.

Mas fiquei ainda mais preocupado quando, em muitos comentários que a decisão do juiz Ivo Rosa suscitou, se afirmou que “o Direito não é para garantir justiça, mas sim para aplicar as leis”. Ah! Então será que o Ministério da Justiça deveria chamar-se Ministério do Direito?

Então há as leis que, aprovadas democraticamente, são, como diria o Sr. La Palisse, “legais”, não importando se são justas. Depois, há as regras e os prazos da sua aplicação que têm de ser respeitados (o formalismo). E depois há a aplicação da Lei e aí o papel dos magistrados e dos juízes!

E o que se viu é assustador. Um juiz que, com grande arrogância, começa por se autoelogiar e queixar-se do muito trabalho que teve, sem férias (cuidado, as férias são precisas para descansar! Se calhar foi a falta de férias que o perturbou!), com uma atitude, já não exijo de elegância, para com quem se discorda, mas, ao menos, de respeito pelo trabalho de colegas da mesma área.

Foi feio! Muito feio mesmo!

E por fim, o resultado que não vou comentar, tantos têm sido os comentários, a maioria certeiros. Só queria salientar que os réus não foram absolvidos!

Só não foram (na generalidade) acusados, impedindo o verdadeiro julgamento que, dado o peso político (e o Sr. Presidente da República, muito bem, referiu que é o direito que serve a política (o governo da “polis”) e não o contrário) não devia deixar de ocorrer.

Com estas decisões (ou não decisões) até nos esquecemos que o PRR nunca mais foi discutido, não houve qualquer expressão pública da consulta que foi feita e, como vem lá uma “pipa de massa” para ser usada, o esquema que não foi julgado não augura grande coisa. Até sempre.

Texto escrito segundo as regras do Acordo Ortográfico de 1990