Opinião

Cinema | Together, a fusão

8 out 2025 17:22

O clímax – perturbador e trágico – encerra o filme com uma força poética rara. Together é um conto de amor e horror em doses iguais

Em Together (2025), o realizador Michael Shanks apresenta uma mistura ousada de terror psicológico e horror corporal, que se transforma numa parábola sobre a fusão entre amor e destruição. O casal Tim (Dave Franco) e Millie (Alison Brie) muda-se para uma zona rural à procura de reconexão emocional, mas o isolamento e a tensão acumulada rapidamente revelam algo mais sombrio: uma transformação física e simbólica que os empurra para uma união literal e grotesca.

A narrativa evolui num crescendo hipnótico. O que começa como um drama conjugal subtil transforma-se, pouco a pouco, num pesadelo íntimo, onde o desejo de se tornarem “um só” ganha contornos monstruosos. A metáfora é clara e poderosa – o amor obsessivo, quando levado ao extremo, anula a individualidade e consome os corpos.

As interpretações de Franco e Brie são o coração pulsante do filme. A química real entre ambos sustenta a verosimilhança emocional, mesmo quando o argumento flerta com o absurdo. Franco oferece uma performance frágil e intensa, enquanto Brie equilibra ternura e desespero, tornando palpável a deterioração da relação.

Visualmente, Together é de uma audácia impressionante. A fotografia, fria e orgânica, reforça o desconforto, e os efeitos práticos de fusão corporal estão entre os mais inquietantes do cinema recente. A banda sonora de Cornel Wilczek acentua o contraste entre o amor e a repulsa, oscilando entre temas românticos e dissonâncias arrepiantes.

Nem tudo, porém, resulta na perfeição. Há momentos em que o simbolismo se torna excessivo e a narrativa perde foco ao tentar justificar o inexplicável.

Ainda assim, o clímax – perturbador e trágico – encerra o filme com uma força poética rara. Together é um conto de amor e horror em doses iguais: uma meditação sobre a necessidade de pertença e o preço da fusão total. Imperfeito, mas memorável, deixa o espectador a refletir sobre até que ponto amar é realmente unir-se – e onde começa o terror de perder-se no outro.