Opinião

Cinema | O Poder do Assombro

1 fev 2020 20:00

Peço desculpa, mas começo este artigo de forma algo abrupta, mas creio que é a única forma de desencadear a linha de pensamento que aqui pretendo expor…

Tendo visto recentemente The Lighthouse, de Robert Eggers, creio que reconheço agora que o cinema só é capaz de transmitir verdadeiramente uma emoção, uma acima de todas as outras, o cinema só sabe tratar de Terror. 

Sim, espanto-me e bastante em dizer isto, pois bem vistas as coisas nunca tive qualquer apreciação pelo género na sua vertente audiovisual, afinal tendo passado pelos anos 2000, o terror fica-me à tona do tédio e abaixo da paciência, olhando para trás, para mim, nada havia que realmente acontece-se neste género que, no início do século, fica preso a uma caderneta de filmes anuais pouco mais que derivativos dos exploitation films dos anos 80.

O que Lighthouse faz não passa por reinventar a roda, mas emprega-lhe um bom uso no sentido que gira em torno de si mesma.

Eggers cria uma narrativa fechada fantástica que perfeitamente serve de adaptação espiritual a qualquer conto de H.P Lovecraft, pois bem, é neste paralelo entre obra literária e projectada que podemos ver “o terror” surgir pela neblina de interpretação.

Se o filme vive de objectos textuais, que, no caso de Lighthouse, vê-se denso e escrutinado por devaneios, velhas pragas costeiras e cantigas imperceptíveis induzidas por grandes quantidades de álcool, a palavra neste filme é a leitura do mesmo, tudo o que não é perceptível, tudo o que pode ser lido de outra forma, tudo o que não conhecemos.

A imagem, filha da fotografia, é a prova dos factos, uma abordagem adulta para com o mundo, dir-se-ia a morte da fantasia, se depois não regressássemos para o texto e para o devaneio, Lighthouse é um mundo demasiado duro para se ser visto, voltamos para falar, voltamos a isto para não ver o que isto é.  

Verdadeiro terror representa-se por um elástico de borracha, que ora se estica ora se relaxa na nossa mente, mas creio que esta apoteose para se traduzir no sucesso de um bom filme como este não o rompe, obviamente estica-o e demonstra nas mãos de um bom realizador todo o seu espectro de tensão, mas deixa-o ainda por quebrar, desfigurado em cima da mesa, pois qualquer bom filme sucede nisto e sai da cinema com o espectador, e se me expresso bem, de forma algo parasítica. 

Há por isso algo de universal a aprender com o terror, de que todas as histórias têm de reter o seu assombro, o cinema vive em epílogo na nossa mente.

Não posso deixar de sublinhar que o que este género de terror tem para oferecer, inclusive em fascículos nacionais, um filme que não podia deixar de ver enquanto estava preso a Lighthouse era o A Estranha Casa na Bruma, um filme que não posso expressar em quantidade suficiente a sorte de ter visto, adaptação de H.P Lovecraft em filme curto de Gabriel Daniel, um dos poucos e entre os melhores visionários de terror em Portugal…

“Terror” até tem o seu interesse largo… Ah! Que bom é isto do gostar!