Sociedade

Waldemiro Júnior (Junhão): “A gente precisa de aprender muito com vocês”

17 ago 2025 14:00

A aposta no turismo tem guiado o prefeito de Ourém do Pará, que vê na geminação com Portugal uma ferramenta para enriquecer o conhecimento técnico da população

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Junhão administra pela segunda vez um território onde metade da população vive da agricultura familiar
Rui Miguel Pedrosa
Claúdia Gameiro

Há perto de uma década, Waldemiro Júnior, por todos reconhecido como Junhão, era prefeito de Ourém do Pará quando começou a ser elaborada e foi apresentada a proposta de geminação com Ourém de Portugal. No momento em que o acordo de cooperação foi finalmente assinado, em 2022, encontrava-se na assessoria do Governo do Pará, sendo reeleito prefeito no início deste ano.

Reconhecendo-se o “primo pobre” desta relação de cooperação, admite que o município brasileiro tem mais a receber do que a contribuir, embora não despreze o legado cultural e a dinâmica ambiental, ligada à Amazónia, que pode trazer a Portugal. Numa relação separada pelo oceano Atlântico e diversas assimetrias sociais, Ourém do Pará olha o seu futuro através das promessas do turismo ecológico e do turismo religioso.

Balneário Aracu, vila de Fátima. Numa cabana rústica, pintada de azul, junto a um igarapé de águas límpidas, numa zona de mata, num dia quente e húmido, as boas vibrações lêem-se e sentem-se em cada canto da praia fluvial. As estruturas de madeira ribeirinhas multicolores, típicas da Amazónia, enquadram-se numa paisagem repleta de baloiços, corações de flores artesanais e redes sobre o ribeiro de águas baixas, num cenário a pensar no Instagram. O sol entra, rarefeito, mas nunca queima.

Este é o pano de fundo simbólico ideal para nos sentarmos à conversa com o prefeito Waldemiro Júnior, pois enquadra a sua aparente visão estratégica para o município: a aposta no turismo ecológico e no turismo religioso. Estamos a falar de um território com pouco mais de 19 mil habitantes, segundo os dados do último Censo disponíveis, e 520 km², cuja população vive sobretudo da agricultura de subsistência (50%) ou dos serviços públicos (30%), segundo dados do autarca. A actividade industrial mineira, ligada ao seixo e também à cerâmica, não chega aos 15%.

Neste contexto, a ligação a Ourém de Portugal tem como foco, segundo explica Junhão, a aprendizagem, para posterior investimento no município brasileiro. “Em Maio completámos 272 anos de emancipação política e sabemos que Ourém de Portugal está além dos 700 anos. Vocês têm uma experiência mais longa que a nossa e a gente precisa de aprender muito com vocês: na parte empresarial, na parte cultural, na religiosidade, no meio ambiente, na agricultura”, reflecte.

O objectivo passa por envolver cada vez mais a população “ouremense”, como aqui é designada, nas dinâmicas geminatórias, no intuito de que adquiram ferramentas para um desenvolvimento mais eficaz e produtivo no território. “Queremos ver o nosso povo crescer”, sublinha o prefeito, “da cultura do nosso povo crescer e da sua vida financeira, para que a pessoa consiga retirar o seu sustento e ter qualidade de vida”.

A nível local, a aposta de Junhão aparenta passar pelo turismo, quer na vertente ecológica, quer através da religiosidade. “A nossa cidade tem o potencial de crescer pelo turismo”, afirma, “temos seixeiras e cerâmicas, mas isso é esgotável, vai acabar”. “Pelas nossas florestas, pelos nossos igarapés, pelo nosso Guamá, pelo nosso acolhimento cultural, pela nossa religiosidade é preciso trabalhar forte a questão do turismo. Turismo que traz renda para as pessoas, um turismo ecológico e turismo religioso”, enumera o autarca.

Se o ecoturismo – uma vertente ligada à relação sustentável entre o ambiente e as comunidades – surge quase por si mesmo, o turismo religioso é uma área de desenvolvimento recente. Existindo um culto estabelecido a Nossa Senhora de Fátima e uma grande religiosidade católica na comunidade, a mudança de toponímia de Furo Novo para vila de Fátima abriu espaço à ambição de criar ali um santuário amazónico àquele que é hoje um dos maiores símbolos da portugalidade.

A ideia actual passa por ir ao encontro de “pessoas que não podem ir a Portugal” e que poderão encontrar na localidade uma representatividade da devoção católica. Crescer através da religiosidade foi, inclusivamente, um tema discutido com o Ministro do Turismo, Celso Sabino, numa passagem recente pelo território, adianta o prefeito.

No ano da Cimeira do Clima (COP30), a decorrer de 10 a 21 de Novembro em Belém do Pará, a pouco mais de três horas de distância – por aqui é considerado “já ali” ao lado – a periferia prepara-se para receber o impacto da passagem de grandes investidores e políticos internacionais pela Amazónia. Por tal, é necessário criar valor, atrair investimento para mais alojamentos e infra-estruturas. Tal só pode ser conseguido, reflecte Junhão, dando-se a conhecer ao mundo. Mostrar “como se vive dentro da Amazónia”.

Turismo: Criar uma identidade para Ourém do Pará
No Brasil, o prefeito distingue-se do presidente da Câmara, que é o equivalente ao nosso presidente da Assembleia Municipal. No seu segundo mandato em Ourém, Mauro Cruz define-se como um “gestor” da vida municipal. Recentemente, adianta, apresentou uma “iniciativa” para viabilizar uma pesquisa científica sobre a história de Ourém do Pará. Numa região onde a história ainda tem como base as narrativas orais que passam de geração em geração, o autarca destaca que “falta criar uma identidade”. “Fala-se tanto no turismo, mas não há uma história oficial que defina uma identidade”, reflecte. “Não dá votos, mas para mim vai valer muito”, comenta, num gabinete onde figura, discreto, um galhardete do município de Ourém de Portugal.