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Sara de Oliveira. Experimentação e fetichismo, de Fuhrer Duhrer à Marquesa do Sabre

24 jun 2023 08:23

A artista apresenta-se hoje ao vivo em Leiria no contexto do 3.º Ciclo de Música Exploratória Portugesa organizado pela Fade In

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“Neste projecto, em particular, desfaço música. Digo sempre que vou destocar fitas”
Ricardo Graça

Pode dar-se o caso de o público a conhecer como Mus Rattus. Ou Marquesa do Sabre. No próximo sábado, em Leiria, será Fuhrer Duhrer. Em qualquer caso, entre o “experimentalismo estético” e o “fetichismo”, sempre disponível para o registo “mais extremo” e “chocante”. A música, a poesia, a fotografia e a colagem têm revelado Sara de Oliveira como uma das vozes mais originais na cidade. Neste sábado, 24 de Junho, o encontro acontece no Castelo, na renovada Igreja da Pena, a convite da Fade In e do terceiro Ciclo de Música Exploratória Portuguesa (19 horas).

Em Fuhrer Duhrer, descobre-se “a total desconstrução do som”, segundo Sara de Oliveira. “Distorção em tudo, não existe uma trilha melódica, não existe uma composição pré-definida”. Etiqueta: harsh noise. “É um bocadinho anarquizar de tal maneira que já não é música, é anti-música”. E explica: “Eu também faço música. Neste projecto, em particular, desfaço música. Digo sempre que vou destocar fitas”.

Apesar de a performance seguir “uma linha de seguimento, um princípio, meio e fim”, todo o resultado sonoro “é um improviso” e “depende inteiramente dos circuitos e dos efeitos que estiverem a ser criados na altura”.

Além de técnicas de foley (sonoplastia) e field recording (gravação no exterior) que conheceu durante a licenciatura em Som e Imagem na Escola Superior de Artes e Design de Caldas da Rainha, a artista de Leiria utiliza, geralmente, dois sintetizadores, pedais, um microfone de voz com efeitos, quatro leitores de cassete (que a meia idade recorda do tempo dos computadores Spectrum) e microfones de contacto para captar objectos. A experiência é “uma construção de várias camadas”.

Como Fuhrer Duhrer, Sara de Oliveira já se apresentou no Porto e em Lisboa, por exemplo, no espaço Desterro. Também em Lisboa, acompanhou recentemente Filipe Homem Fonseca, com quem colaborou num livro editado através da Paper View.

O nome Fuhrer Duhrer inspira-se no pintor Albrecht Dürer e junta-lhe uma mistura de ultraje e apego ao trocadilho: “Acho o fascismo deplorável, é uma palavra que toda a gente vai perceber o que quer dizer e eu quero colocá-la no centro da chacota, tirar-lhe a conotação”.

Com um percurso de 10 anos, Fuhrer Duhrer é uma das facetas com que Sara de Oliveira se mostra interessada em explorar “o que é diferente, o que é novo”, à procura de “uma expressão atípica e menos convencional” e, em qualquer hora, motivada pela “necessidade pessoal de provocação”, que reconhece com orgulho: “Os meus pais podem comprovar: sempre gostei de dar espectáculo e sempre gostei de ser respondona e de reivindicar os meus direitos. Já cheguei a fazer isso no contexto político, hoje já não faço, porque perdi a paciência”.

Mus Rattus e Marquesa do Sabre são senhas para a poesia intimista e experimental da artista de Leiria em que as palavras ganham novas coordenadas e significados, e também para os trabalhos de fotografia e colagem, tudo manifestações em que o fetichismo, impresso a preto e vermelho, é o “gosto estético” mais evidente.

Feminismo? “Sim, completamente”. Há “uma ideia de transmissão imagética de poder feminino”, conclui. “O poder que confere à figura feminina é o que me interessa transmitir”.