Sociedade

Momento zen do dia: cuidar da horta

4 ago 2016 00:00

Para uns, funciona como um regresso às origens. Para a maioria, funciona como terapia. Falamos da horta urbana de Leiria que, há cerca de um ano, floresce nas traseiras de uma urbanização da cidade.

Fotos: Ricardo Graça
Maria Anabela Silva

Sábado de manhã. Ainda não são dez horas e já há azáfama na horta. Hermínio e José estão a separar sementes de plantas já germinadas no local. O objectivo é criar pequenos kits para oferecer a quem passa.

Mais além, Sebastião apanha espinafres para o almoço e ocupa-se da tarefa de “entutotar” tomates, amarrando o troco principal. Ao lado, Natália aplica uma infusão de cavalinha para afastar o míldio, enquanto Hélder arranca velhos feijoeiros e prepara o terreno para nova plantação. Ao fundo, Jorge vai arrancando algumas ervas daninhas que teimam em crescer, pondo os olhos nos galináceos da sua mini-capoeira.

Não, não estamos numa qualquer aldeia da região. Estamos às portas de Leiria, atrás de uma urbanização onde, nos últimos anos, foram crescendo prédios. Mais precisamente, nas traseiras da Quinta da Gordalinha. É aí que, há mais de um ano, floresce uma das duas hortas urbanas criadas pela Câmara de Leiria (a outra é na encosta do castelo, no antigo horto municipal).

Mas esta é uma horta especial. Não há apenas hortaliças, legumes, ervas aromáticas ou flores a crescer. Também há lugar para a leitura, com o Conto da horta, promovido por uma utente, ou um “hotel dos caracóis” onde são 'hospedados' os moluscos encontrados entre as alfaces, as couves e outras espécies do género, e que, de tempos a tempos, acabam transformados em petisco de “comer e chorar por mais”. Dizem- nos e acreditamos, mesmo sem provas.

Nesta horta, está também a nascer um espaço zen, onde, dentro de pouco tempo, se poderá fazer meditação, ao lado de um mural de “tributo à natureza”. A mais recente valência da horta é fruto da criatividade e da filosofia de vida de Natália Narciso, assistente social, agora no desemprego, que é uma das utilizadoras do espaço e que, no passado recente, tinha estado ligada a uma associação que promove a produção agrícola em modo biológico. Pelo que, quando soube do projecto da Câmara de Leiria, decidiu, de imediato, que também iria tentar ter aí o seu cantinho. E assim foi.

Mas, mais do que um espaço onde consegue cultivar muitos dos vegetais que consome, ajudando o orçamento familiar, sobretudo agora que está sem trabalho, e porque é vegetariana, Natália diz que ganhou “um novo grupo de amigos”.

O espírito de camaradagem que se gerou entrou os frequentadores da horta é, aliás, um aspecto realçado por todos os hortelões que partilharam a sua experiência com JORNAL DE LEIRIA. Muitos até eram vizinhos de bairro mas antes “quase não se conheciam”, conta Hermínio Domingos, revelando que o convívio é frequentemente “estimulado” em jantares ou almoços, mais ou menos espontâneos.

Foi até criada uma zona para esse efeito, com a construção de uma churrasqueira e de um forno, feitos com recurso a materiais reciclados e com a “devida autorização” da Câmara. É aí que frequentemente acabam muitas das visitas à horta, que deveriam ser breves, apenas para uma rega ou para cortar uma alface, e que terminam já noite dentro. “Acontece com frequência”, admite Hermínio, enquanto aproveita para fazer um pequeno canteiro de ervas aromáticas, com a ajuda do pequeno João António, que, na manhã de sábado, fez uma visita surpresa à horta e que, a avaliar pelo entusiasmo que revelou, há-de querer voltar.

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