Sociedade

Idosos esperam (e desesperam) pela reabertura dos Centros de Dia

27 ago 2020 14:51

Enquanto os Centros de Dia se preparam para reabrir, são muitos os idosos e as famílias que desesperam pelo retomar desta importante resposta social

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Nesta fase são muitas as instituições que mantêm apoio aos idosos, através de visitas ao domicílio
Ricardo Graça
Daniela Franco Sousa

De portas fechadas, devido ao risco de contágio de Covid-19, os Centros de Dia revelaram ser, de forma inequívoca, uma resposta social da maior importância não só para os seus utentes bem como para as suas famílias. Os idosos contaram ao JORNAL DE LEIRIA como têm sido os seus dias, agora mais cinzentos, sem as actividades e os rostos amigos dos seus Centro de Dia.

Já as famílias confidenciaram a dura realidade de quem tem agora de se desdobrar em tarefas para manter a gestão do lar e da vida profissional, sem desc urar o bem-estar dos seus pais, com quem ficaram a tempo inteiro desde há meses.

Do lado de lá, estão os responsáveis pelos Centros de Dia, a quem já foi dada permissão para reabrir, desde 15 de Agosto, mas cujas premissas exigidas para a reabertura são tão difíceis de cumprir, que muitos não sabem como nem quando terão condições para voltar ao ac tivo.

Os dias ficaram mais vazios

Para Manuel Brites, de 76 anos, o encerramento do Centro de Dia da Associação de Solidariedade Social das Cortes (Assiste) foi um duro golpe. Habituado a partilhar os dias com outros idosos, a jogar às cartas e ao dominó, o viúvo vê agora os dias a passar mais lentamente e sem o mesmo gosto. Está a morar com a filha, que “é como um Deus do céu”, mas ainda assim esgueira-se volta e meia para casa do vizinho, para assistirem juntos aos filmes da televisão. “Estou à espera que me digam alguma coisa do Centro de Dia”, conta Manuel Brites, que se mostra muito preocupado. “Acho que se vai acabar tudo... vamos andar lá de máscara todo o dia?...vamos ver como vai ser...”

Também em casa de Jaime Neves e da esposa, Maria de Lurdes, os dias custam agora mais a passar, desde que o Centro de Dia da Assiste encerrou. O que está a fazer dona Lurdes? “Renda”. A senhora faz tanta renda. É para quem? “Isto é para a minha filha Isabel”, explica prontamente a octogenária, que vive há dez anos com a doença de Alzheimer. A renda, bem como as pequenas tarefas na cozinha, ajudam-na a preencher as horas, agora que não pode frequentar o Centro de Dia. A família pede-lhe apoio em quase todas as actividades, para se manter ocupada. Afinal, também ela sente a falta do tempo em que se juntava aos outros idosos nas actividades da Assiste.

O marido, Jaime, com quem celebrou 60 anos de casamento numa grande festa promovida pelos func ionários da associação (quando a Cov id-19 não era ainda tema de conversa), lamenta muitíssimo o encerramento do Centro de Dia. “Aqui tenho de ficar fechado e lá sinto-me à solta. Sou mais livre”, compara sem hesitação.

Aos 84 anos e com uma lucidez invejável, o idoso gostava não só de se ocupar com as actividades lúdicas partilhadas entre todos os utentes como de apoiar nos trabalhos administrativos da Assiste. Dedicou muitos anos da sua vida aos papéis e aos contactos de telefone, quando operava no ramo dos seguros. Portanto, ajudar com papelada na Assiste era um prazer e uma forma de se sentir útil. Até a pandemia lhe vir baralhar os planos, animado pelos funcionários desta associação, Jaime estava inclusive a tratar de tudo para recuperar a sua carta de condução.

Recentemente, já em casa, uma queda, seguida de internamento hospitalar, veio debilitar a sua condição de saúde. Por essa razão, há olhos mais atentos aos seus passos lá em casa, para que uma actividade mais energética e menos ponderada não agrave as suas complicações. Com movimentos mais condicionados, a literatura tem sido a sua grande aliada durante os últimos meses.

Jaime Neves devora livros, delicia-se com romances históricos. Faz sopa de letras e palavras cruzadas. E, porque as saudades são muitas, de vez em quando pega no telefone e liga àqueles amigos da Assiste, que sabe serem mais sozinhos, e que de certo precisam do seu afecto. Também as visitas das funcionárias da Assiste, “que são todas muito simpáticas” são sempre um dos momentos altos neste novo quotidiano do idoso.

Famílias sob situação de grande desgaste

Maria Trindade, filha de Jaime e de Maria de Lurdes, expõe a dureza da situação vivida pelas famílias, desde que os Centros de Dia encerraram. Quando há cerca de um ano surgiu a ideia de levar os pais a frequentar um Centro de Dia, sobretudo da parte do pai, havia alguma relutância.

No entanto, bastou uma primeira experiência e ambos adoraram, ao ponto de a Assiste se tornar “quase como uma segunda casa”, onde estes tinham o acompanhamento “espectacular” dos funcionários e a companhia de “cerca de 40” idosos, com quem passaram partilhar muitas actividades. “No dia em que recebemos a informação de que, por causa da pandemia, o Centro de Dia tinha de encerrar, gerou-se o caos na nossa família e na cabeça dos meus pais também”, salienta a filha.

“Somos cinco filhos e cada um faz o que pode. Mas todos trabalhamos. É terrível”, explica Maria Trindade. Duas irmãs revezam-se entre os dias e as noites e os restantes são um suporte muito importante nas consultas e nas muitas outras tarefas que é preciso assegurar quando se têm ao encargo dois idosos. Mas a situação é de “muito desgaste”, quando se trata de octogenários, um deles com Alzheimer, e outro que passou entretanto a ter de fazer deslocações frequentes para realizar diálise. O Centro de Dia garantia a ocupação do casal, o que dava mais margem aos filhos para se ocuparem dos seus empregos. Isso

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